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O Auto da Compadecida e a Geografia do Nordeste Brasileiro

Por que assistir?

O filme é uma adaptação do livro “Auto da Compadecida” de Ariano Suassuna (1927-2014). O autor buscou nessa peça teatral retratar a região em que nasceu e sua cultura. Ariano ressalta o seu conhecimento pelo desenvolvimento das formas de expressões populares tradicionais que marcam o gênero de vida do sertanejo nordestino.

Sem dúvidas, é possível assistir ao filme sem conhecer a peça, porém a leitura da obra pode nos levar a ver o filme com outros olhos. A peça escrita em 1955, contém elementos cômicos, porém trágicos ao retratar o contexto geográfico nordestino. É importante também ressaltar que a peça tem elementos da literatura de cordel que influencia na imaginação fílmica de Auto da Compadecida, lançado em 2000.

O filme como expressão da obra literárias de Suassuna, traduz o regionalismo através das expressões populares utilizados pelos seus personagens, dando ao Sertão Nordestino características singulares e realistas. A crítica social que o filme aborda tem relação com o tripé de poder que caracteriza a realidade da sociedade e da geografia do interior nordestino: o padre (poder clerical e cultural), o coronel (poder econômico, latifundiário que detém em suas mãos a subalternidade dos sertanejos), e o sertanejo (sobrevivente cotidiano que tem sua alma roubada pelo padre e seu território para se reproduzir expropriado pelos coronéis).

No filme é traçado de maneira cômica e dramática ao mesmo tempo o perfil dos sertanejos nordestinos que estão sob as opressões e sujeitos ao coronelismo (aos poderes das famílias de coronéis donos de terras), uma característica marcante no Sertão.  João Grilo (Mateus Nachtergale), um homem pobre, é a expressão do povo oprimido que tenta sobreviver através de sua inteligência nessa região que é marcada por miséria e pobreza alarmantes.

A trama encabeçada por Selton Mello (Chicó) e João Grilo (Mateus Nachtergale) e grande elenco Marco Nanini, Lima Duarte, Denise Fraga e Diogo Vilela, Fernanda Montenegro é um show de interpretações antológicas que marcaram a filmografia da comédia brasileira.

 Vale a pena assistir em sala de aula?

  • O filme tem 157 minutos de duração. Recomenda-se assistir na íntegra, em uma única sessão, em mais de uma aula ou em atividades extraclasse.
  • É um excelente exemplo da riqueza de nosso folclore e cultura popular. Além de servir de referência para produções teatrais, para as aulas de Língua Portuguesa (literatura de Cordel) ou para ser explorado nas aulas de Arte.
  • Temas abordados: História do Brasil, coronelismo, cangaço, religião, diferenças sociais, seca e o impacto na vida dos nordestinos, literatura, teatro, regionalismos. Nesse sentido, é uma obra fílmica com alto potencial para se explorar a aproximação interdisciplinar em sala de aula.

Sobre o filme:

A trama se passa em Cabeceiras, na Paraíba, na época do cangaço. Neste contexto, a cidade sofre com a miséria da seca e que contrasta com a classe dominante representada pelo Coronel (latifundiário), o comerciante burguês (padeiro) e o pároco (Igreja).

Neste cenário árido e hostil, digno dos filmes westerns italianos, acompanhamos os anti-heróis Chicó, um trapaceiro compulsivo, e o mentiroso João Grilo. Suas aventuras os levam à uma série de encrencas – inclusive com um aterrorizante cangaceiro interpretado por Marco Nanini (irreconhecível em sua caracterização), até chegarem a um desafio final na forma de um julgamento para lá de apocalíptico com Jesus Cristo, Nossa Senhora e o Diabo!

Curiosidades:

O filme surgiu inicialmente como uma minissérie televisiva, transmitida na Rede Globo, em 1999.

Visando a exportação para outros mercados, o produtor Daniel Filho pediu ao diretor Guel Arraes a filmagem minissérie em película 35 mm. O resultado é fantástico. Apesar da data da produção, a obra até hoje não ganhou características estéticas que a destacam das outras produções que abordam o mesmo tema. A minissérie alcançou recorde de audiência na época de sua transmissão. Os personagens João Grilo e Chicó se tornam ícones pop da comédia. O bordão “não sei, só sei que é assim”, repetido inúmeras vezes para justifica Chicó, tornou-se frase popular.

Selton Mello e João Grilo praticamente “metralham” suas falas, em um ritmo rápido e frenético. Há momentos que se torna impossível entender o que eles dizem.

Devido ao sucesso na TV, a obra virou longa-metragem nos cinemas. Para isto, os quatro capítulos televisivos de 40 minutos cada foram editados em 1h35min, eliminando tramas desnecessárias e incluindo cenas exclusivas para o filme. O resultado é excelente de se assistir nos dois formatos.

A representação de Nossa Senhora (Fernanda Montenegro), o Diabo (Luís Melo) e Jesus Cristo (Mauricio Gonçalves) é carregada de simbologia e dialoga com as referências culturais do folclore brasileiro. Um exemplo disto é que Jesus foi representado por um ator afrodescendente. Mas a unidade da obra com a excelente intepretação de Maurício Gonçalves foi tamanha que o fato passou despercebido e não gerou polêmicas na época de seu lançamento.

Vale lembrar que em dezembro de 2024, João Grilo e Chicó estarão de volta em O Auto da Compadecida 2, leia o resume sobre a produção em: https://www.omelete.com.br/filmes/chico-e-joao-grilo-surgem-juntos-em-nova-imagem-de-o-auto-da-compadecida-2″